15.6.16

ser menina

quando eu era pequena. quer dizer. quando eu era menor (isso é um amigo da família que diz. que eu nunca fui pequena, não posso falar inverdades). eu amava um texto chamado mulherzinhas. louisa may alcott. teve uma peça de teatro com ele ali no shopping da gávea. mulherzinhas.

eram 4 personagens, crescendo nos eua da guerra de secessão. eram 4 mulheres, claro. eu lembro que na peça a sílvia buarque era uma delas. a que morria de tuberculose. mas ela era a personagem fraca. a que eu não gostava. eu gostava da jo. não lembro quem fazia a jo. no cinema era a winona ryder, acho.

a jo, gente. ela não queria ser menina. ela queria ser jornalista. e meninas não podiam ser jornalistas. a jo cortava os cabelos para vender porque a família tava dura que o pai tava na guerra. a jo era tudo que eu queria ser. talvez a jo seja um pouco a minha mãe e eu seja a luiza, morrendo de tuberculose.

eu me identificava com a jo. eu não entendia porque eu tinha de ser menina. apesar de ser brutalmente vaidosa. e de ser de uma família que jamais me impediria de ser o que eu quisesse ser. inclusive solteira. enfim

tudo isso porque me perguntaram sobre feministas e autoras que eu curto e eu lembrei que. louisa may alcott. leiam sobre ela. faz é muito tempo. ela tava aí escrevendo sobre meninas que não casam e vão pra cidade virar jornalistas. faz é muito tempo, e as pessoas precisam lembrar disso. que nós, mulheres, existimos nesse mundo de homens. e hoje eu ouvi um colega falar "eu penso nas mulheres da europa, que eram casadas, a não ser que fossem aristocratas, não eram cosmopolitas" e peço que lembrem de jo. que era um alter ego de louisa. lembrem que no séc XIX nós já existíamos.

chega de fingir que as mulheres só existem como indivíduos a partir da segunda metade do séc. XX. isso também é invisibilização. a gente sempre teve aí. em menor número talvez. mas sempre teve. e não vamos a lugar algum e vamos estar cada vez mais. cortando nossos cabelos. usando calças. deixando os cabelos longos e usando saias. a gente não vai a lugar algum, amigos. se acostumem. somos aqui. pertencemos aqui. nossa minoria política vai continuar fazendo barulho. continuar se tornando isso daqui que é o outro de vocês. um dos outros. vocês, homens brancos ocidentais. vocês são um universal que cada dia existe menos. nós, todos os outros. nunca não existimos, mesmo contra toda a sua narrativa de universalidade. nós aqui estamos. e não esperamos ninguém.

2 comentários:

Dani disse...

Nunca te conto, mas o tanto q amo o q escreve...

tunics disse...

<3 eu fiquei meio sem saber o que falar. obrigada.