29.5.17

endurecer

talvez a batalha mais difícil, mais diária, seja pra não endurecer com as pancadas que a vida dá. pra manter o sorriso. o peito aberto. o passo pronto pra tentar de novo. depois de tanto não. de tanto erro. de tanta porrada. talvez o mais difícil seja poder se abrir. poder sentir. uma vez, me falaram que eu tinha vocação para a felicidade. nunca entendi o que seria isso. não tenho vocação para nada, pensei. nem pra ser eu. hoje em dia, eu acho que entendi o que a pessoa queria dizer. depois da pancada. o sorriso, a gargalhada. depois do choro, a leveza. de quem sabe que a vida é essa que veio. a vida é essa que virá. e que a gente pode e deve tentar achar esse momento sem sofrimento. esse momento de felicidade. com uma banana frita se der. ou com uma conversa. ou uma cerveja. a felicidade tenta escapar sempre. mas ela é tão nossa. que só posso oferecer um ombro amigo a quem esquece. eu já apanhei da vida mais do que parece. eu nasci com coração doente. eu perdi irmão. eu perdi pessoas queridas que foram antes da hora. de diversas formas. tem uma hora em que a gente tem de virar pra vida e falar "pode bater. eu volto." pela felicidade de um elogio do rapaz bonito. de um chocolate. de um abraço de um amigo querido. eu volto.

10.5.17

mudada

faz tempo que não escrevo aqui. as pessoas falam que voltarei mudada para casa. eu concordo sempre. eu não sei o que isso quer dizer. voltar mudada. a gente muda quando dá mais um passo, não? a gente muda o tempo todo. eu mudei já umas 3x hoje, acho. aquela frase velha do não podemos mergulhar 2x no mesmo rio. eu tendo a discordar, ainda cito langston hughes e luandino. em algum momento mergulhei na diáspora. tanto que precisei ver de onde ela começou. e daí estou aqui olhando para isso. e não consigo. nada. estou como folha em branco, muda e sem conseguir organizar um pensamento. e logorreica, preencho espaços vazios. aqui, no facebook, no word, no evernote, num caderno. as palavras precisam sair para eu tentar uma produção de sentido com tudo que li a vida inteira e o que estou vendo. a produção de sentido ao se ler hugo e chegar em paris é imediata. ou eça e lisboa. até machado e rio de janeiro. a cidade é uma força em si de sentido da literatura. eu entendi achebe ao reler aqui. as palavras ganharam mais força. se isso é possível. a destruição ficou mais patente. mas não consegui produzir sentido nenhum. só compreender. quero uma mão que me guie e diga "aqui, segue esse caminho" mas eu sei que nesse caminho só tem espaço para mim. como de resto o caminho que me fez chegar até aqui. pegando sonhos dos outros com as mãos e trançando os meus. e agora eu me vejo olhando pronde cheguei. pronde quero ir. e a vontade única é de pedir ajuda. como tantas vezes, na verdade. a vontade única é de ter alguém pra ir junto. eu tenho tido vontade de casar. de ter filhos. coisas que nunca tinha pensado de verdade. nem quando casei. eu casei porque gostava dele. e achava que devia. agora eu acho que de repente. eu queria não ter um caminho tão sozinho nessa vida quanto o que eu trilhei. eu sei, eu sei. os amigos estão todos aqui. mas a coisa bonita da amizade é esse perto-longe. essa similitude sem andar pelo caminho. essa compreensão. hoje, como de resto nessa viagem, hoje, que eu parei de chorar por nada e por saudades. hoje eu entendo. que só o que eu queria era não estar sozinha. mas eu estou. e isso é bom. porque é o que eu sei ser. é o que eu busquei e trilhei. mas talvez. não sei. acho que não é mais o que eu quero. aqui eu tô aprendendo a me olhar.