26.4.13

entranhado

tem gente que fica entranhado. que come por dentro o nosso fígado e a gente não repara. e um dia acorda e tenta olhar porque. e não tem porque nenhum. uma vez leu sobre quem trabalha em matadouro. e o cheiro de gordura entranha. gordura animal, não tratada. não solta da nossa pele. entranha.

especialista em ficar com gente entranhada. mariana andava com caraminholas na cabeça. as pessoas entranham fácil, pensou. como se ela não soubesse deixar as pessoas de fora. não, não era isso. as pessoas eram a gordura? não, também não. pera. 

no momento estava bom ter alguém entranhado. mariana conheceu joão meio por acaso. não tinham amigos em comum. não trabalhavam juntos. nada. estavam no mesmo bar. ela, voltando do banheiro, esbarrou nele. a cerveja dele caiu no chão (parando pra pensar, como assim?) ela pediu desculpas. quis pagar outra pra ele. começaram a conversar. moravam na mesma rua. ele era mais novo. não muito. mas parecia mais bem resolvido na vida do que ela. como se fosse difícil. mariana estava sempre por um fio em qualquer trabalho. sempre meio em crise.

joão era calmo. era um antípoda. e as coisas pareciam simples. estranho aquilo. mariana nunca tinha tido calma na vida. nunca tinha nem procurado, na verdade. joão era a calma em tudo. no dia a dia. nas conversas. na cama. tudo tinha seu tempo, tudo era tranquilo. tudo era em paz. e ela foi deixando aquilo ser parte dela. entranhar nela. tudo em calma.

e daí que mariana, sempre tão mal humorada. mariana, que nunca via o lado bom das coisas. mariana estava em paz. e entranhada de joão. e aquilo tudo ali podia não acabar nunca.

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